MárioCrespo,  Jornalista
Maria de Lurdes Rodrigues não  tem condições para continuar a gerir o sistema de educação em Portugal.  Porque já não é eficaz nessa função. Porque é um facto insofismável  que o pessoal que ela administra não aceita a sua administração.  Isso esvazia de conteúdo as suas funções. Já não está em causa  a eficácia da sua política. A questão é que ela não vai conseguir  implementar as boas ideias que tem, nem impor as más. O argumento  de a manter no cargo para não "desautorizar" o Primeiro-ministro  é falso e perigoso. Mantendo-a nas funções que desempenha a desautorização  do governo de Sócrates é constante. Chegou a altura de ver que  isso é mau para os alunos. Só podem ser eles quem está em causa.  Não pode haver razões de defesa de imagem política que justifiquem  esta intransigência porque a manutenção de um percurso de imposição  administrativa começa a ser um risco de segurança nacional. É péssimo  para o quotidiano escolar ter um sistema totalmente desautorizado com  professores a desafiarem o governo e o governo a desautorizar-se em  frémitos de afirmação de voluntarismo vazio. 
Da necessidade de  reformas sabe-se com fundamento científico desde o trabalho de Ana  Benavente que denunciou que um quarto dos portugueses mal sabia ler  e que só dez por cento da população é que entendia completamente  aquilo que está escrito. Mas esse estudo tem década e meia e nada  de substancial foi feito no entretanto. Por isso, o que está em questão  não é a avaliação de professores. Apreciações de desempenho são  meros pormenores de gestão de pessoal. O que é preciso, como consta  de uma lúcida reflexão dos docentes da Escola Rainha D. Amélia, é  fazer a escola cumprir com as suas funções na socialização de crianças  e jovens. É promover a criação de hábitos de disciplina interiorizados  que se multipliquem depois na vida adulta. Entre Cavaco Silva, o governante  confrontado com o estudo de Ana Benavente, e José Sócrates, este processo  de calamitosa estupidificação do país não foi interrompido por um  projecto lúcido. O governo actuou agora como se o problema estivesse  nos docentes e não no sistema de docência e nos curricula. Actuou  como se o problema único de Portugal  fosse o do excesso de privilégios e não o do defeito de cultura.
E assim as frágeis construções da demagogia política trouxeram,  mesmo com a intimidação de PSPs à paisana e processos disciplinares  da DREN, uma centena de milhar para as ruas de Lisboa. E o Primeiro-ministro  mostrou a sua fibra assistindo em silêncio ao martírio de Maria de  Lurdes Rodrigues que se desdobrou nas TVs a tentar demonstrar o indemonstrável  axioma socrático que a sua política é infalível e o défice de compreensão  é do país. A resposta de Sócrates foi a de marcar uma manifestação  de desagravo para o Porto. Primeiro era para ser na rua, depois numa  praça, depois num pavilhão e vai sempre soar a falso no clamor sem  fim das turbas dos indignados. Foi um contra-ataque ridículo no meio  de muito comportamento bizarro. O Professor Augusto Santos Silva protagonizou  o momento de infelicidade quando em Chaves quis assinalar os três anos  de governação numa espécie de estágio para o anunciado comício  do desagravo. Foi vaiado. Ripostou tentando conjurar os seus Manes.  Invocou os nomes dos pais fundadores, dos velhos companheiros  que diz serem os seus da luta que diz ser a sua. Salgado Zenha, Mário  Soares e Manuel Alegre. E nenhum lhe respondeu. Tentou depois o exorcismo,  amaldiçoando os seus demónios pessoais, os grandes e os mais pequenos.  Álvaro Cunhal e Mário Nogueira. E nenhum lhe respondeu. Ouviu  vaias cada vez mais altas e a voz embargou-se e disse: "eu não  me calo...eles calam-se primeiro que eu." Depois repetiu, baixinho  como que a querer convencer-se "...eles calam-se primeiro que eu".  E não se calaram. Ao ouvir na Antena  1 este terrível registo de desgovernação só me ocorreram as sábias  palavras de Juan Carlos para o tiranete venezuelano: "por que no  te callas".
Mário Crespo escreve no JN, semanalmente, às segundas-feiras (10.3.08)
2 comentários:
Continuem, continuem, para que todo o País possa confirmar aquilo de que já se suspeitava, a falta de nível a todos os títulos) dos professores que alinham (e só esses) nesta chuchadeira.
Com os elevados gastos na educação (em percentagem do PIB) e os péssimos resultados obtidos, querem que o regabofe e o desbarato prossiga.....um bocadinho, só um bocadinho, de bom senso não lhes ficava mal!
Mário Crespo é um jornalista sério e culto. A sua análise é lúcida e, por isso, contundente. É, aliás, com agrado que vejo o tema da Educação discutido pelos seus convidados no jornal das 21h na SICNotícias. Sem partidarismo e quase sempre com profundidade.
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