Houve em tempos remotos da História das Abelhas de um Reformista Roseiral uma célebre abelha Doutora (promovida de abelha-mestra a abelha doutora após um famoso concurso de titularidade destinado a abelhas do 10.º Escalão) que trabalhava para a organização empresarial «Abelhas Socraticamente Afoitas, SA». Os clientes e consumidores do mel produzido por esta organização adoravam a qualidade do mel que lhes era vendido e exigiam que a organização produzisse mais mel do que na temporada melar anterior.
Com um consideravel custo para as abelhas coordenadoras e organizadoras das actividades abelhares, bem como para as próprias abelhas trabalhadoras, foi implementado um pesado sistema de medição do desempenho a meio da estação melar. Este sistema, destinado a medir o número de flores visitadas e outros objectivos complementares considerados necessários para alcançar a excelência no mel produzido, previa o retorno de informação sobre o desempenho individual da abelha avaliada, mas nunca foi dito às abelhas da colmeia que o seu objectivo era produzir mais mel para que a «Abelhas Socraticamente Afoitas, SA» pudesse aumentar as suas vendas de mel.
Maria de Lurdes, assessorada pelo famoso consultor Vitelinho Kanas, foi aconselhada a fazer um balanço centrado no sucesso da sua gestão e a não perder tempo com o que correu mal. Eis o extracto do mais importante do relatório da Abelha Doutora Maria de Lurdes ao Chairman Sócrates:
«Aumentámos o número de visitas às flores em 300% e diminuimos o tempo de viagem entre flores em 60%. Estamos de parabéns! Complementarmente conseguimos diferenciar as abelhas excelentes e muito boas das abelhas regulares e das pouco produtivas. O sistema de avaliação de desempenho implementado foi um grande sucesso e esta colmeia - após 30 anos sem avaliação - não podia passar nem mais um ano sem se proceder à diferenciação do mérito. (...)»
O Dr. Santos da Casa (mais conhecido pelo «o não faz milagres»), humilde funcionário público, investigador nas horas vagas, dedicado cidadão à causa pública da colmeia, estudou o dito relatório e descobriu que o relatório não era transparente e escondia algumas realidades negativas:
- Devido ao facto de as abelhas andarem muito ocupadas na tentativa de visitarem tantas flores quanto possível, tinham limitado a quantidade de nectar transportado ao mínimo possível tendo por objectivo aumentar a velocidade de voo entre flores;
- Uma vez que as abelhas sentiam que competiam umas contra as outras (consequência de só as abelhas com melhor desempenho individual conseguirem alcançar as reduzidas quotas de excelente ou muito bom e serem reconhecidas através de prémios) deixaram de partilhar informação entre elas;
- A ausência de partilha de informação e conhecimento levou a que não fossem efectuados relatos preciosos como novos campos de flores avistados e por explorar, informação preciosa para o aumento da produtividade da colmeia;
- Que a quebra na quantidade e qualidade do mel produzido estava disfarçada no relatório apresentado ao Chairman Sócrates e surgia justificada como um facto resultante do mau desempenho de um conjunto de abelhas classificadas com a classificação "menos boa" (em linguagem positivista e politicamente correcta, muito do agrado do consultor Vitelinho Kanas);
- Que o desempenho "menos bom" desse grupo de abelhas - propostas para um programa de mobilidade especial e/ou despedimento em caso de uma segunda temporada de maus resultados -resultava do facto de se preocuparem quer em transportar a maior quantidade de néctar que podiam transportar por cada voo efectuado, quer da sua preocupação em partilharem com as suas colegas abelhas a sua informação e conhecimento, nomeadamente sobre campos de flores avistados nos seus voos, ainda por explorar.
Perante estas descobertas, o Dr. Santos da Casa, tomou a iniciativa de comunicar ao Chairman Sócrates os factos do seu conhecimento bem como um conjunto de melhorias que podiam e deviam ser efectuadas. Ainda hoje, passados anos, aguarda resposta e foi com tristeza que viu a «Abelhas Socraticamente Afoitas, SA» afundar-se num célebre pântano.
MORAL DESTE CONTO DE FADAS: Muitas das medidas de avaliação de desempenho implementadas nas organizações, bem como as respectivas recompensas, têm efeitos preversos e contrários ao que se pretende efectivamente estimular e premiar.
http://contributos.blogspot.com/2008/03/uma-abelha-doutora-chamada-maria-de_14.html
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